Racionais - Entre o Gatilho e a Tempestade
(Cód. Item 32805153)
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Dizer que os Racionais é o maior grupo de rap do Brasil é chover no molhado. Poucos artistas são hoje tão influentes no Brasil como Mano Brown, Ice Blue, Edi Rock e KL Jay – isso porque, desde o início, eles adquiriram uma representatividade que vai muito além da música, seja pela sua origem social, pelo sucesso, pelo discurso antissistema ou pelas controvérsias nas quais se viram envolvidos. Com a linguagem do jovem da periferia, falando dos problemas do povo da periferia, ressaltando a pele negra dos que estão à margem, a violência e a exclusão, o grupo escancarou a realidade de um país que continua a crer que “a questão social é um caso de polícia”, um século depois de a frase ter sido cunhada por um ex-presidente da República. Assim como a importância dos Racionais transcende a esfera musical, os artigos deste livro abordam o impacto do grupo tanto por suas letras, sua estética, como por seu posicionamento social e político --a recepção de seu trabalho na mídia, a relação com as autoridades, a censura, o mercado fonográfico–, passando a limpo um caminho aberto com raiva e talento e que fez do grupo “a voz ativa de um povo que é discriminado”.
Sobre o Autor
Doutora em sociologia pela Unicamp com estágio doutoral junto ao King´s College London. É professora de sociologia no Departamento de Ciências Sociais da Universidade Estadual de Londrina (UEL). Realizou estágio pós-doutoral no Departamento de Sociologia da Unicamp e no CSU-CRESPPA/CNRS em Paris. Dirige, em parceria, a coleção de livros HIP-HOP em PERSPECTIVA e a linha de pesquisa Hip-Hop em Trânsito (Cemi-Unicamp). Autora do livro: Não Vá se Perder Por Aí: A Trajetória dos Mutantes (Annablume/Fapesp, 2010).
Doutora em Antropologia Social pela Unicamp e Harvard Alumni Fellow. Atua com os temas de equidade, raça, gênero, diversidade, educação, infância e juventude, história e cultura afro-brasileira e africana, cultura hip-hop e PALOP (Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa). Cocoordena a coleção Hip-Hop em Perspectiva e a linha de pesquisa Hip-Hop em Trânsito do CEMI-Unicamp.
Doutora em Antropologia Social pela Unicamp e Harvard Alumni Fellow. Atua com os temas de equidade, raça, gênero, diversidade, educação, infância e juventude, história e cultura afro-brasileira e africana, cultura hip-hop e PALOP (Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa). Cocoordena a coleção Hip-Hop em Perspectiva e a linha de pesquisa Hip-Hop em Trânsito do CEMI-Unicamp.
Trecho. © Reimpressão autorizada. Todos os direitos reservados
DA APRESENTAÇÃO Deivison Faustino {p. XXI} Muito já se escreveu sobre o hip-hop, o rap e os Racionais. Tem-se visto, no entanto, a consolidação desses temas como um campo sólido de estudos protagonizado por muitos dos nomes que assinam os artigos que se seguem. Fato é que a pesquisa sobre os Racionais tende quase sempre a envolver aspectos éticos, políticos e estéticos que transcendem o gênero musical em si, e abarcam temas como a dinâmica social urbana brasileira, a relação entre racismo, gênero e desigualdade social, bem como as formas históricas de resistência e (re)existência cultural e política contemporânea. DOS AUTORES Paula Costa Nunes de Carvalho {p. 36} Portanto, se descontadas as aparições na MTV e eventualmente na TV Cultura, os rappers evitavam contatos com a televisão. Não se pode dizer o mesmo da mídia impressa, que tratava de falar dos Racionais mesmo que eles se esquivassem das entrevistas. São vários registros de pequenos textos divulgando shows; muitas reportagens sobre rap em que o grupo era citado, ainda quando não era o tema principal; cobertura das vendas de discos; comparações com o outro grande nome da época – apoiado pela estrutura das majors – Gabriel, o Pensador; e até matérias que cruzaram a ponte, como a capa da Revista da Folha de 1994, quando o então repórter Sérgio Dávila foi ao Capão Redondo de carona no Opala de KL Jay para entrevistar os Racionais, e “Hip Hop Promove uma Revolução na Periferia”, em que a repórter Patrícia Villalba, representando o caderno Zap!, participou de um bate-papo com mais de trinta integrantes da posse Conceitos de Rua, no Capão Redondo. Esses textos, insisto, ficavam mais restritos aos cadernos de cultura e agendas culturais dos jornais paulistas (especialmente a Folha, já naquela época com a maior circulação do país) e a revistas especializadas, como a Bizz. Silvana Carvalho da Fonseca {p. 57-58} A cultura hip-hop brasileira tomou as periferias do país e produziu uma série de agenciamentos. Diante desse cenário, “movimento” é a palavra que mais define a cultura hip-hop em seus fluxos, contradições, reinvenções e mudanças. É desse contexto que homens negros e periféricos se projetaram nacionalmente, performatizando masculinidades que produziram rupturas em padrões preestabelecidos frente às contradições que perpassam suas vidas. Essas masculinidades periféricas que ora se encontram, ora se afastam foram e são produzidas centradas em práticas genocidas do Estado brasileiro, que legitimou o racismo, sobretudo, projetando no homem negro a expressão máxima de corpo perigoso e animalizado. Desde seu movimento construtivo até a contemporaneidade, na relação entre produção e consumo da cultura hip-hop, o homem negro vai performatizar modos de ser das masculinidades no Brasil. Suas inscrições vão passar por uma série de mudanças, demarcadas pelo movimento histórico da sociedade brasileira. Waldemir Rosa {p. 93-94} Quando se propõe a pensar o tema das masculinidades no rap e no hip-hop, o caminho comumente mais traçado é o de identificar os exemplos de sexismo e de opressão às mulheres e a homofobia nas letras e, a partir dessa genealogia, construir as críticas ao poder masculino e seus mecanismos de opressão no interior do campo do rap. Gostaria de propor aqui um caminho um pouco distinto. Considero o rap como um movimento intelectual afro-periférico e urbano no Brasil, como já tinha dito. Assim, mais que buscar identificar os equívocos de seus intelectuais, proponho apreender sua teoria como uma tentativa de produzir uma explicação da realidade e exercer sobre essa realidade alguma forma de controle, nos termos já discutidos anteriormente. Não se trata de ser permissivo em relação ao sexismo do rap brasileiro, mas de compreender a questão para além da construção de estratégias de “flagelação pública” dos rappers para demonstrar a necessidade de seu arrependimento por terem “se comportado tão mal”. Os valores sociais vinculados às masculinidades apontam para a centralidade da categoria da autonomia como definidora da condição masculina. Chegamos a essa centralidade ao percebermos como o “ser homem” se diferencia do “não ser homem”, por sua capacidade de definir-se pelos próprios termos e pela própria fala. Esse “definir-se pelos próprios termos e pela própria fala” não remete apenas ao direito de narrar, mas também à capacidade de manter sua narrativa como verdadeira na arena do enfrentamento discursivo. Dessa forma a autonomia emerge como categoria central para a articulação dos valores das masculinidades na obra dos Racionais, uma vez que é a prova factual da vitória no enfrentamento discursivo Janaína Machado {p. 110} Falar dessa quebra na relação sujeito-objeto e a maneira com que os Racionais cavam o espaço de sujeito do conhecimento dialoga com a provocação que lançamos a partir do título “Rimo, logo penso”, no sentido de reconhecimento da autoridade desses sujeitos na produção da prática discursiva, especificamente se considerarmos que os sujeitos negros e subalternizados foram confinados numa ordem do discurso na condição de objeto, ou seja, como temática e assunto, como mero conteúdo da rima na condição do outro subalternizado no campo das ciências sociais e humanas. Walter Garcia {p. 130} Quem faz a crítica da estética do Racionais não compreenderá o que é a obra, a sua forma e os sentidos que tem se não considerar a “magia” de que falou Mano Brown, isto é, se não estudar como e por que os raps são criações estéticas que se dirigem ao corpo e à imaginação. Ana Lúcia Silva Souza {p. 148} Como a cultura hip-hop se disseminou globalmente, suas vozes desafiadoras e autodefinidas foram multiplicadas e amplificadas à medida que desafiam também os conceitos convencionais de identidade e nacionalidade. O hip-hop emerge, encoraja e integra práticas inovadoras de expressão artística, produção de conhecimento, identificação social e mobilização política. Nesse aspecto, transcende e contesta noções estabilizadas de raça, nação, comunidade, estética e conhecimento. Bruno de Carvalho Rocha {p. 165} Racionais, um dos principais e mais significativos grupos de rap do Brasil, torna-se para nós um “lugar hermenêutico” para esta reflexão. O grupo fez e ainda e parte de um movimento que mobilizou e fundamentou parte significativa da história mais recente da luta antirracista e do pensamento social periférico no Brasil. Por meio de seu grande sucesso, os Racionais trouxeram visibilidade inédita para as questões que giram em torno da periferia, resgatando e redescobrindo o valor desses territórios diante daquele mundo construído da “ponte pra lá”. Elaboraram um tipo de linguagem própria, um colocar-se no mundo, fruto de um legado de mobilizações estéticas e politicas das classes populares e da comunidade negra dos anos 1980, que vai refletir e se desdobrar dentro de um complexo contexto político especifico do começo da década de 1990. Paulo César Ramos {p. 189} O Racionais escrutinou a força repressiva do Estado ao indicar como autoritarismo e racismo se encontravam na periferia, implementando violações, traumas, sofrimento, revolta e ódio. Na caracterização da alteridade, estão indicados os estereótipos que agitam as instituições, o funcionamento do preconceito racial, as formas de discriminação racial. Por outro lado, também apontam as formas de resistência, o encorajamento da reação e a busca por novos horizontes morais. Rachel Sciré {p. 213} É possível arriscar que “Capítulo 4, Versículo 3” consolida um formato bastante replicado por outros MCs, com a representação da figura do marginal por meio do discurso do rapper, e a transformação de histórias sobre delitos em mote para as rimas. Piaraju Pablo D’Andrea {p. 237} Se a memória histórica da negra e do negro brasileiro, ao pensar o trabalho, necessariamente passava pela experiência da escravidão, da exploração, da humilhação e da exclusão, a década de 1990 apresentou novos matizes para o problema. O que se verificava naquele momento histórico era um alto índice de desempregados e de subempregados e um aumento dramático da pobreza e do genocídio contra moradores das periferias, fundamentalmente o jovem negro. A experiência da exploração somada à experiência do desemprego fez aos poucos ruírem as promessas do mundo do trabalho e seus possíveis benefícios. Não se verificava também ser mais possível a ascensão social e muito mais distante ainda estava a emancipação da classe por meio do trabalho. Se o trabalho formal tinha sido historicamente uma porta entreaberta, nos 1990 ela se fechava jogando muita gente pra fora. A corrosão do mundo do trabalho diminuía as possibilidades de acesso a recursos, e os horizontes da juventude pobre naquele momento eram a entrada para o crime, a criação artística, a dependência de programas sociais e os empreendimentos econômicos individuais. Acauam Oliveira {p. 268} É interessante notar o paralelo feito entre o crescimento vertiginoso da violência e o aumento da variedade de produtos que era necessário adquirir, assim como o crescimento paralelo da cena black da qual emergirá o rap – que passa inclusive pelo samba. Novamente o rap surge enquanto resultado da violência e como alternativa ao desfecho inevitável (“Corpo negro semi-nu encontrado no lixão em São Paulo / A última a abolir a escravidão”). O show vale exatamente isto: oferecer uma opção que não termina em morte em um contexto marcado por um quase determinismo de origem. Vale lembrar que os acontecimentos narrados na canção terminam em 1987, um ano antes do surgimento oficial dos Racionais.
Detalhes do produto
- Editora : Perspectiva; 1ª edição (20 abril 2023)
- Idioma : Português
- Capa comum : 320 páginas
- ISBN-10 : 6555051450
- ISBN-13 : 978-6555051452
- Dimensões : 14.2 x 1.8 x 21 cm
Talvez o grupo mais importante e influente da música brasileira dos últimos 35 anos, o Racionais explode no cenário cultural ao falar diretamente com os jovens das periferias das grandes cidades brasileiras, com temas de grande impacto social, como violência policial, discriminação social e racial, autoestima e desenvolvimento pessoal e ascensão social. Neste livro, a trajetória do grupo e sua obra são analisadas por estudiosos, revelando sua dimensão transformadora na sociedade brasileira contemporânea.